Greve por salários iguais aos da Soflusa

Vitória da unidade na <em>Transtejo</em>

Luís Gomes
Após a greve dos dias 3, 4 e 5 às horas de ponta, a administração cedeu num aumento do prémio de assiduidade de 50 euros, a partir deste mês, com um acréscimo de mais 25 euros, a partir de 1 de Outubro. Os trabalhadores da Transtejo provaram que vale a pena lutar.
Na passada terça-feira, os sindicatos voltaram a reunir e a administração cedeu à reivindicação de mais 50 euros no prémio de assiduidade. Na mesma tarde, o plenário geral de trabalhadores concordou com a proposta que ainda contempla um aumento de 2,5 por cento na tabela salarial.
Artur Toureiro, José Varandas, Jorge Vendeirinho e Nuno Costa, dirigentes do Sindicato dos Transportes Fluviais e da Marinha Mercante, que convocou a greve, juntamente com a Fetese, o Sitemaq e a Comissão de Trabalhadores, explicaram ao Avante! os motivos da paragem da quase totalidade dos 450 trabalhadores da TT.
A greve foi considerada «histórica», porque teve a maior adesão dos últimos dez anos na transportadora fluvial que efectua a ligação no Tejo entre Lisboa, Trafaria, Porto Brandão, Cacilhas, Seixal e Montijo. Apenas alguns bilheteiros e fiscais, através de um residual sindicato afecto à UGT, aceitaram cumprir um papel divisionista, recusando aderir à luta. Mas, uma significativa parte dos trabalhadores desta profissão deu a resposta adequada: as estações do Seixal e do Montijo estiveram fechadas. A tentativa de boicote apenas se sentiu «onde a precariedade obrigou a trabalhar», afirmou Artur Toureiro.

A 20 contos de distância

«Faltavam 150 euros mensais - trinta contos - para igualarmos o prémio de assiduidade atribuído na Soflusa, de 200».«A outra empresa tem a mesma tutela e efectua exactamente as mesmas funções: transportar passageiros no Tejo», salientou Jorge Vendeirinho. Com a actualização agora conquistada, os trabalhadores passam a auferir de um prémio inferior, em cem euros, ao praticado na Soflusa.
Só no ano passado é que se iniciou, na TT, uma leve aproximação, mas não sem luta: «Sob ameaça de greve é que a administração cedeu os primeiros 50 euros», lembrou Artur Toureiro.
Também no subsídio de turno, há acentuadas diferenças. Na Soflusa, aufere-se 40 euros, enquanto mestres, maquinistas e marinheiros daTTrecebem apenas 12,5 euros.
Na Soflusa, trabalhadores com a mesma categoria profissional auferem mais 15 por cento no vencimento-base, se compararmos com a tabela praticada na TT. A discrepância de salário entre mestres é de mais de 60 euros, situação motivada por «os trabalhadores na Soflusa terem sempre demonstrado grande unidade nas lutas, união que lhes tem garantido melhores acordos», afirmou José Varandas.
«A empresa tem a mesma tutela, os quadros superiores são os mesmos e, em termos salariais, estão equiparados à tabela na Soflusa. Só os restantes trabalhadores é que são discriminados», acrescentou Jorge Vendeirinho.

O alerta do PCP

O Grupo TT/Soflusa tem a área da manutenção sob ameaça de privatização. «O próprio administrador diz ignorar como vai ser, se será uma fusão entre aTTe a Soflusa, se ficará apenas uma delas», revelou ainda Jorge Vendeirinho.
Ao tomar conhecimento do primeiro passo dado na tentativa de privatização da manutenção da TT, através da adjudicação de trabalho a outra empresa, a Comissão Concelhia de Almada e o Grupo Parlamentar do PCP, através do deputado Bruno Dias, efectuaram um encontro com os trabalhadores do sector, em Fevereiro.
Segundo Bruno Dias, a grande participação nesta iniciativa deveu-se ao facto de os trabalhadores terem sido confrontados com a adjudicação, apenas quando esta foi anunciada no boletim informativo da empresa. Todo o processo decorreu «nas costas dos trabalhadores», e o anterior administrador afirmava desconhecer qualquer adjudicação, afirmou ainda.
O grupo parlamentar apresentou um requerimento para tentar saber quais eram as intenções da tutela, mas não obteve resposta concreta por parte do executivo PSD/PP.
No encontro com os trabalhadores, Bruno Dias e Augusto Flor, membro da Concelhia comunista, alertaram para os perigos decorrentes da alienação daquela parte fundamental da empresa. Tanto como as matérias pecuniárias, este foi o outro motivo determinante para a adesão total à greve dos trabalhadores da manutenção.

Que tutela é esta?

«Que tutela é esta? Como pode o Estado abrir mão dos transportes públicos com a tentativa de privatização?», perguntou indignado Nuno Costa. «Vão pôr os utentes a pagar mais de 50 euros por cada passe? É isso que pretendem? Transportes só para ricos?», questionou ainda.
Nuno Costa considera urgente uma intervenção parlamentar, a fim de se apurar a realidade na empresa, uma vez que «estão em causa dinheiros públicos e a função social do transporte colectivo».
Os representantes dos trabalhadores - a quem o administrador nunca concedeu uma audiência em três anos - pretendem ainda saber para onde foram os milhões gastos na compra de catamarans para a Soflusa com receitas da TT, através de movimentos financeiros que deixaram a sensação «de se estar a tirar de uma empresa para dar a outra», enfraquecendo a capacidade económica da Transtejo, considerou Jorge Vendeirinho.
Nuno Costa sublinhou ser ainda mais incompreensível a transferência de duas embarcações daTTpara a Soflusa, antes de ter sido atribuída qualquer verba compensatória desse movimento, e que se encontram paradas, a acumular prejuízos.

Benesses a chefias

Os sindicalistas denunciaram ainda a recente rescisão de contrato por parte de funcionários com cargos de chefia, mas que continuam a trabalhar na empresa, após terem auferido de uma choruda indemnização. Pretendem saber «se agora, também é admissível gastar assim dinheiro sem que se entenda o que é que a empresa ganha com isso», afirmou ainda Nuno Costa.
Notícias vindas a público no Correio da Manhã e não desmentidas, denunciaram que, o Ministério dos Transportes terá enviado à Inspecção-Geral da Obras Públicas, no dia 18 de Abril, um conjunto de denúncias de irregularidades alegadamente atribuídas à anterior administração, através de transferências de garantias bancárias exigidas aquando do negócio de compra de navios da classe catamaran, em Singapura, aquando da Expo´98. As garantias deviam ter sido depositadas em instituições financeiras portuguesas, mas a transferência ter-se-á efectuado através de um banco holandês, evitando assim o pagamento do imposto de selo, avaliado em 800 mil euros. A mesma notícia dá nota de alegadas viagens de técnicos aos estaleiros de Singapura, usadas por familiares e amigos do Conselho de Administração.

O papel “único” do Partido

Os sindicalistas apelaram à compreensão dos grupos parlamentares para esta injusta realidade, porque, «em última análise, quem acabará por pagar a factura será o utente com serviços piores e mais caros», considerou ainda Nuno Costa, que destacou – com a concordância dos restantes sindicalistas - o Grupo Parlamentar do PCP como «o único que, até agora, tem dado provas de estar ao lado dos trabalhadores nesta luta», afirmou.
O mesmo sindicalista salientou ainda o papel do Avante!, como «o único órgão de imprensa que se dignou vir falar com os representantes dos trabalhadores». «Toda a comunicação social dominante censurou os motivos da nossa luta», acrescentou.


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